Homologação de sentença estrangeira e o princípio do melhor interesse do menor

 

por Elaine F. G. Rockenbach

 

A homologação de sentença estrangeira, que é um dos objetos de integração jurídica internacional, é um instituto que visa dar executividade às decisões proferidas por tribunais estrangeiros.

Em outras palavras, para que uma sentença, proferida nos Estados Unidos, por exemplo, que fixa alimentos em favor de um filho menor seja cumprida aqui no Brasil, é necessário que o Superior Tribunal de Justiça, avaliando todos os requisitos legais, faça a homologação, conforme preceitua o art. 105, j, da Constituição Federal brasileira.

Ocorre que, como todo instrumento processual, a homologação de sentença estrangeira tem suas particularidades. A saber, o art. 24 do Código de Processo Civil determina que:

ação proposta perante tribunal estrangeiro não induz litispendência e não obsta a que a autoridade judiciária brasileira conheça da mesma causa e das que lhe são conexas, ressalvadas as disposições em contrário de tratados internacionais e acordos bilaterais em vigor no Brasil.

Assim, se existe uma sentença estrangeira proferida, não há impedimento para que um juízo brasileiro julgue sobre a mesma causa. No exemplo já citado, havendo uma sentença proferida nos Estados Unidos, não existe impedimento para que um juízo brasileiro conheça de ação que também verse sobre os alimentos fixados em favor de filho menor.

Ainda tomando o exemplo como parâmetro, se a sentença proferida pela autoridade judicial brasileira decidir de maneira diversa sobre os alimentos, teoricamente, por respeito à ordem pública e à soberania nacional, essa deveria prevalecer sobre a decisão estrangeira, constituindo óbice à homologação da sentença americana proferida anteriormente (HDE 1.396/EX, Corte Especial, DJe 26/09/2019).

Contudo, em caso recente, o Superior Tribunal de Justiça decidiu (AgInt na HDE 4959/EX, Corte Especial, DJe 10/10/2022) que o entendimento anterior não se aplica a qualquer caso. Há peculiaridades que podem impedir sua aplicação. Confira-se:

embora, como regra, a superveniência de decisão proferida pelo Poder Judiciário do Brasil sobre tema que também fora examinado na sentença estrangeira seja causa de improcedência do pedido, esse entendimento não pode ser inflexível, sobretudo quando há má-fé da parte que ajuizou posteriormente a mesma ação no Brasil, pouco tempo após o trânsito em julgado da primeira, sem indicar o endereço da parte adversa, sem informar ao juízo a pré-existência da decisão estrangeira e sem apresentar motivo plausível para não ter requerido a homologação da decisão estrangeira no Brasil.

 

Desse modo, diante da má-fé da parte executada no intuito de usar a justiça brasileira para se furtar da obrigação previamente estabelecida por sentença americana, o STJ entendeu que deveria prevalecer no caso o princípio do melhor interesse do menor, a quem se destinam os alimentos. Esse princípio, consagrado em âmbito internacional pela Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança e do Adolescente, visa proteger integralmente e resguardar os direitos do menor, garantindo seu desenvolvimento saudável na família e na sociedade.

No caso analisado pelo STJ, o valor fixado no exterior era expressivamente maior do que o montante fixado pelo juízo brasileiro, o que favorece o alimentando, resguarda seu direito diante da situação de conflito. Por isso a sentença americana foi devidamente homologada.

Conforme declinado no início deste texto, a homologação de sentença estrangeira também tem suas peculiaridades. Vale lembrar que, além desses detalhes, cada caso traz também suas próprias características e exigências. Além disso, pode ocorrer a incidência de legislações e princípios específicos. Por isso, é sempre aconselhável buscar consultoria junto a um profissional habilitado e especializado para lidar com esse tipo de causa.